domingo, 25 de junho de 2006

PELA NOITE DENTRO


Ontem à noite apercebi-me o que uma simples falha de luz pode causar, para muitos um grande trantorno, acredito que plausivamente justificável, mas para outros tantos, para nós foi um grande alívio e a demonstracção mais clara que as pessoas têm muito mais a dar de si, apenas não o fazem porque às tantas não têm espaço.
Mudámos de bar porque a conversa caía invariavelmente no "apagão", e o som da música perturbante que nos entra nos ouvidos estava-nos de certa maneira a fazer falta, naquele espaço, com os hábitos a ele inerentes pareceria no minimo estranho não haver reacções adversas e felizmente as ouve.
Os candeeiros todos estilizados deram lugar a velas de segunda, mas que souberam dar um ambiente de primeira, a música aos altos berros por sua vez deu lugar a uma guitarra acústica e a diversas vozes que se foram juntando ao longo da noite, entoando melodias que ninguém gosta, ou que ninguém aceita gostar!Qual house qual quê!Venha o Sérgio Godinho e afins, porque no fundo são essas que nos unem, e que nos fazem recuar a tempos passados, que nos provocam nostalgia, mas acima de tudo uma grande afinidade com qualquer estranho que ali estivesse, já bastante bem "bebido", as posições ditas correctas para se estar num café depressa se alteraram, depressa nos sentimos em casa, no nosso conforto, onde esticamos as pernas onde calha e nos espreguiçamos com toda a convicção sem medo de fazer aquela cara feia ao bocejar!
São estas as pessoas a que gosto de chamar de pessoas...Resta saber se são precisas todas estas condicionantes para nos vermos com olhos de ver.

sábado, 17 de junho de 2006

CAMINHOS


Num deserto sem fim, percorri caminhos incertos, caminhos que deslizam nas sombras do meu ser, da minha alma imune, mas que procura incessantemente ver.
A noite ao luar, as estrelas a cintilar, e o teu barulho a adormecer-me, sentia a tua respiração quente e quase surda, ouvia o teu sorriso distante em ecos de recordação, e eu perdida na escuridão.
A ilusão diante dos meus olhos fazia-me desejar, fazia-me querer agarrar, mas está longe, tão longe esse mar.

Levantar-me, sair da areia onde me encontrava mergulhada não mais que horas talvez, mas para mim anos, era cada vez mais penoso de suportar.
A tua voz, o som da tua voz…a sussurrar, ainda era a espada mais forte, que lutava sem água para sobreviver, mas com vento para voar nos meus sonhos, no meu eterno imaginário a pairar.
Queria correr, saltar, talvez gritar…e porque não amar…amar mais, para mais tarde contar aos demais.
E as lágrimas caíam, o corpo está cansado, a alma não obedece e a confusão permanece.
Sentimentos vazios, ocos de profundidade, belos ao comum mortal…tão desejados na minha mera existência, tão afastados na minha consciência…
Paz, sentir o branco a entrar nas veias, a percorrer os caminhos incertos e ínfimos da estrada que é a vida, sentir o arrepio de frio ao penetrar o fogo dos teus olhos, sentir a vida a tomar forma, a ganhar cor, consistência…sentir-me sem a poder viver, respirando a esperança de poder conquistá-la, agarrá-la, e talvez porque não um dia amá-la…

quinta-feira, 15 de junho de 2006

MAR


Sinto as ondas baterem na minha face
estão tão geladas, quando eu só precisava de calor
o vento…esse quase que leva o meu corpo
embala a minha alma e faz-me duvidar se quero enfim,
continuar…
Que aperto cá dentro, que sufoco, que agonia,
porque chorarei eu afinal?
Só queria parar, só gostava de ter forças para parar
de lutar e ir somente em frente, voar,
e desaparecer no luar…
A areia…a areia está-me a magoar! Tirem-na daqui!
agora! Já! Mas é tanta, tão imensa…e agora?
Como irei eu fugir dela?
Se tudo o que se depara à minha frente é somente
o infeliz deserto.
Eu não quero, não quero… continuar aqui…
Sozinha…no escuro, no frio…e com esta areia
Sempre a incomodar-me, sempre a magoar-me…
Que nem as ondas limpam
Que nem o vento leva
Que só o sol a secaria, só o sol a derrubaria…

sexta-feira, 9 de junho de 2006

SONHO


Ela estava a chorar...não ouviu os seus passos, silenciosos, suaves, macios como sempre. Olhava o vazio com uma profundeza inquitetante, com uma serenidade gélida, de quem por mais nada espera, de quem por tudo já espera.
Não quer saber do sol lá fora, ele brilha mas não a aquece, nunca a aqueceu, nunca fora o suficiente para fazer dos seus dias, dias luminosos, pelo contrário, traziam-lhe à memória, memórias perdidas, guardadas num coração impossível de colar, num coração gasto, sofrido de amar.
Chorava tempos idos, chorava os sorrisos, as gargalhadas que outrora teve vontade de soltar e não soltou, chorava os momentos não vividos, os momentos parados, chorava por ele.
Os passos percorriam na escuridão a desarrumação de uma vida inteira de impaciência, indiferentes ao espaço procuravam apenas um local para ficar, ficar para o resto da eternidade...ela não os ouvia, não conseguia, já há muito...embora já há muito esses não tivessem saído do mesmo local, mas ela não via, não queria...
Fechou os olhos e deitou-se na cama, encolhida, coberta de cobertas encarquilhadas, guardadas nos armários de sempre, com o cheiro de sempre, doce, um cheiro de amor, inalando com a pressa de quem tem de respirar para sobreviver...
Não sabia onde estava, tudo estava mudado, mas tinha a certeza de que ela estava lá, sentia-a, ouvia os seus soluços...e a sua vontade de a abraçar aumentava, passo a passo, degrau a degrau, esquina a esquina, corria sofrego à procura do que deixou para trás sem saber como, sem se perceber a si mesmo, tropeçava como tinha durante tantos anos tropeçado com a diferença que agora tinha decidido continuar, independentemente de tudo, indiferente à dor...
Uma músia começa a ecoar bem lá no fundo, ambos a ouvem, ambos a dançam sozinhos mas acompanhados como sempre, perdem-se no tempo, a mente não sossega, não pode sossegar, voa...ambos querem voar...quando se chocam...
Dois olhares penetretantes cortam o silêncio dilacerante que corrói a velhice das paredes, a velhice dos objectos, o cheiro...esse, está agora mais vivo que nunca, já não é preciso fechar os olhos. Ele toca-lhe no rosto...Ela sorri...O toque é forte, prolongado, insistente, desenfreado, louco...
A sensação de paz é imensa, a felicidade tinha voltado, não precisava de mais nada, nem de comida, nem de água...apenas mais uns tempos de vida para se recordar daquele sonho...
Sonho que a iria manter acordada até na exaustão poder adormecer de novo, sem medo, sem medo de não sonhar...

domingo, 4 de junho de 2006

DINHEIRO


O mundo é engraçado, faz-me rir...quase sempre um sorriso irónico, mas ainda assim um sorriso...É sobre a morte que vos quero falar, mas a morte vista de uma outra perspectiva, nova, embora a mais velha de todas. É tema quase tabu para a maioria das famílias falar-se em dinheiro depois de um acontecimento trágico, como é o caso da morte, é tabu, enquanto o que foi ainda não foi...porque mal o coração deixa de bater, e depois de algumas lágrimas derramadas, toca a tratrar de assuntos pendentes. Nunca vi tanta pressa, tanta vontade, tanta disponibilidade e tanto conhecimento por parte das pessoas como nesta fase...parece que de um momento para o outro é necessário unirmo-nos para falar de coisas, que estratégicamente são imensamente bem pensadas antes de serem ditas, não vá o diabo tecê-las.
Até então ninguém quer saber de dinheiro para nada, depois chega-se a questionar como foi possível sobreviver com o que tinhamos.
Descobrem-se tantas carecas...descobre-se tanto acerca dos outros, tantos mistérios, tantos segredos...mas ninguém quer saber, vale tudo, não se olha jamais a meios para chegar a fins, o que importa realmente é usurpar e não se ser usurpado.
Achamos sempre, ou queremos achar, que connosco, com a nossa família vai ser diferente, mas não é, e custa tanto a acreditar.
Com o tempo aceitamos, porque para pessoas como eu, o dinheiro não é tudo, chega a ser mesmo nada. Mas a mágoa faz-me reclamar justiça, não a dos homens, nessa não acredito, mas sim a divina.

sexta-feira, 2 de junho de 2006

DESILUSÃO

DESILUSÃO

De todos os sentimentos que até hoje experiênciei, a desilusão é sem dúvida o mais penoso. E tudo invariavelmente se prende com as falsas expectativas que criamos em relação ao outro. Desiludirmo-nos nem por isso é fácil, de tal forma fugimos a essa dor, porque é uma dor, que como tantas outras não mata mas corrói, e o que corrói só pode matar. Mata a alma, mata a alegria de viver e mata acima de tudo a confiança que antes depositavamos no bom senso dos outros.
Talvez não devessemos à partida esperar muito dos outros...ou esperar apenas o que nos têm a oferecer...mas será isso o suficiente? Ou o que é suficiente para nós existe? É possível conformarmo-nos com o que temos, mas será isso que fazemos de melhor, ou desta forma estamos apenas a desistir? Também para desistir é preciso ter coragem, abandonar o que sempre defendemos e apreendermos a realidade tão somente como ela nos é apresentada, é desilusão. Esperamos sempre que os amigos façam connosco o que nós fariamos com eles naquele preciso momento, mas isso nem sempre, salvo raras excepções, acontece, e parecendo que não isso transtorna-nos, ao ponto de nunca mais olharmos essas pessoas da mesma forma. No imediato para além desse sentimento atroz, tudo se esquece, tudo se perdoa, mas o nosso instinto de sobrevivência é maior, e qundo precisamos de algo sabemos com quem ir ter. O engraçado é que existem amigos de todos os géneros e feitios, o amigo que é bom para a farra, para os copos, o amigo com quem nos sentimos confortáveis em conversa de café, o amigo que nos ouve exaustivamente nos piores momentos, o amigo ideal para ir às compras, o amigo com quem simplesmente partilhamos o silêncio, ou até aquele que nos diverte.Qual destes é o verdadeiro amigo? Ou é o amigo? ninguém reúne tudo isto, é impossivel...se quero beber um copo, já sei que nessa noite no minimo tenho que estar animada, e mais do que isso animar os outros, requisto essencial para não saltar de imediato daquele circulo social, não posso por momento algum tocar em acontecimentos mais desagradáveis...Faz-me pensar que afinal apesar de não conseguirmos sobreviver sem ou outros, diáriamente vivemos sem eles, sozinhos. Pior, parece-me que quase compramos um serviço, que de antemão sabemos ir receber de determinada pessoa. E tudo isto porque deixamos de acreditar, porque a desilusão perante o que vemos é tanta que mais vale precavermo-nos e munirmo-nos de tudo e de todos, para nos podermos defender e quase sempre atacar.Porque às vezes parece-me que vivemos em plena guerra fria.